A linguagem é o instrumento que permite aos seres
comunicarem. No caso do homem foi invenção sua e pode ser gestual, vocal, escrita
e mais outras formas que agora não me lembram e não interessam. É perfeita?
De modo algum! Constitui obra prima nalguns idiomas, mas está longe de ser
perfeita. Tem pontos débeis—muitos—consubstanciados na vaguidade, na
ambiguidade, na indeterminação e não sei que mais. Mas é sobre a vaguidade que quero mandar
uns bitaites porque é uma das dificuldades referidas frequentemente nas
larachas que leio.
Exemplo clássico de vaguidade é o de "monte",
ou soros em grego, porque foi Eubulides
que se saiu com esta peça (ainda não havia Syriza nessa altura). Um grão de
arroz ou de areia não fazem um monte. Dois grãos também não, três também não,
rebabá. Quantos grãos, afinal, fazem um monte? Podem dizer-me
que três grãos já são um montinho. Muito bem: e quando passa o montinho a monte
e este a montão? Neste caso, a expressão linguística "monte" é vaga. Como é a de "careca",
"baixinho" e por aí fora. Na verdade, a vaguidade não tem grande
importância nestes casos. Mas, e na Ciência, na Filosofia e na Teologia, por
exemplo? Aí a porca torce o rabo.
Por exemplo, quando se fala da origem do universo, se não
se aceita a sua eternidade, acredita-se que teve um princípio e que antes era o
nada. O nada, neste caso, é o cúmulo da vaguidade porque, se formos exigentes, o
nada não existe, embora tal afirmação pareça pleonástica, não o sendo. O nada não é mero
vazio porque este implica espaço e, se há espaço, já não há nada porque há
espaço. Mas mesmo o puro nada, existindo, anula-se a si mesmo. Isto acontece com vários outros exemplos.
Segundo os filósofos,
há a vaguidade semântica, ou da linguagem, e a vaguidade ôntica, relativa ao
que é ou existe. Bertrand Russell dizia que a vaguidade é exclusivamente semântica
e resulta da imprecisão da nossa representação mental que nos leva à
"falácia do verbalismo". Com todo o respeito por Russell, e um
nadinha acanhado, pergunto se a imprecisão da representação mental não resulta
das nossas falácias verbais; isto é, se as coisas não são ao contrário. A
linguagem é secreção do pensamento, ou é instrumento do pensamento? Não tenho a certeza,
mas suspeito que é instrumento—pelo menos, parcialmente.
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