sábado, 10 de junho de 2017

EU ESPERO TUDO

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Há pessoas de quem não se espera nada. E há aquelas de quem se espera tudo. O prof. Marcelo pertence às duas categorias. Em passeio nos Açores, o homem resolveu explicar o segredo da nossa felicidade, ele próprio: “Quando iniciei o meu mandato, achava que o país estava carecido de afecto e que era uma prioridade esse afecto. As pessoas estavam pessimistas, estavam cépticas, estavam crispadas. (…) o país estava perdido, corria tudo mal”. Então, como um anjo, surgiu o Salvador, ainda mais reluzente que o Sobral.
Com franqueza, já desisti de tentar perceber se o prof. Marcelo diz estas coisas a sério ou se se diverte a gozar com pategos. A verdade é que os pategos existem, e aparentemente não apenas entre os “populares” que se acotovelam nas ruas para uma “selfie” com o equivalente indígena da Princesa do Povo. Nas redacções jornalísticas (crescentemente uma força de expressão) e no comentário, também parece haver gente que toma à letra as afirmações do Senhor Presidente. Não falo dos que utilizam aquela retórica vazia em benefício da propaganda governamental. Falo dos que se mostram realmente convencidos de que os “afectos”, leia-se a conversa fiada, o sentimento de cordel e um populismo que envergonharia alguns estadistas do Terceiro Mundo são capazes de influenciar o rumo de uma nação ou, modestamente, o quotidiano de um único dos seus cidadãos. Há, a julgar pelas evidências, indivíduos que votam, conduzem, procriam e determinam o alinhamento de um “telejornal” a acreditar que o facto de o chefe de Estado desfilar a sorrir numa feira de tremoços em Melgaço influencia o poder de compra de um solicitador do Cacém.
Trata-se de um exemplo acabado do pensamento mágico, por azar um eufemismo de atraso de vida. À semelhança dos primitivos que dançavam para espevitar a colheita de cevada, muitos portugueses modernos supõem que o pão decorre do circo. Não decorre, e o pior não é não o saberem agora, mas não o terem aprendido antes e não virem a compreendê-lo depois. [...]
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Alberto Gonçalves in Observador
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